Inspiração, procura-se! 3/4 - Pedro Pereira


João olhava confuso para o suposto deus embriagado. Nada daquilo fazia sentido.
– Não, você não é um deus! Você está é podre de bêbado!
– Se eu não fosse um deus, podia fazer isto?
Num abrir e fechar de olhos, o sujeito rechonchudo desapareceu numa nuvem de pó púrpura sem deixar rasto.
– Ora bolas… – comentou João. – Onde é que ele se enfiou?!
– Aqui em cima!
João olhou para cima. Dionísio estava agora sentado num dos ramos de uma oliveira com um sorriso idiota nos lábios.
– Sou ou não sou um deus, hein?!
O peso de Dionísio era demasiado para o pequeno ramo e antes que João pudesse responder, o deus caiu da árvore, aterrando no chão com violência.
– Você está bem?
– Ai as minhas hemorroidas! – queixou-se Dionísio enquanto se colocava novamente em pé, sempre com cuidado para não derramar o precioso líquido da garrafa. – Agora que já esclarecemos isto do deus, resta saber quem és tu e o que fazes aqui.
– O meu nome é João e não faço ideia de como aqui vim parar. Estava a escrever e…
– Haha! Um escritor! Isso explica tudo! E o que raio estavas tu a escrever que fosse tão mau ao ponto de aqui vires parar?
– Estava a trabalhar no meu novo romance sobre…
– Não digas mais nada! Esquece essa ideia, eu tenho a solução para ti! O romance perfeito!
– Ai sim?
– Imagina um mundo repleto de magia onde um jovem, com uma cicatriz em forma de chávena de café na testa, é admitido numa escola de magia onde os alunos morrem aos montes…
– Mas isso é a história do Harry Potter!
– Olha que coincidência gira! – comentou Dionísio sem dar importância comentário.
– Bem, eu agradeço a ajuda, mas eu só quero mesmo voltar a casa.
– Tens péssimo gosto em bebidas e péssimo gosto em literatura… Vocês escritores são todos iguais! Acham-se todos superiores e não querem a minha ajuda! Que seja! Anda daí, eu levo-te à Calíope, pode ser que ela tenha a cura para o teu problema.
– Calíope? A musa? 
– Sim, os escritores são a especialidade dela. Felizmente que já recuperou daquela depressão…
– Depressão?
– Sim, há uns tempos atrás apareceu por cá uma escritora que tal como tu estava com problemas. Ela estava a escrever um romance sobre um canibal que brilhava ao luar e se apaixonava por uma rapariga sem sal.
– Isso soa familiar… – comentou João.
– A Calíope ajudou naquilo que pôde, mas era um caso crónico. Nem com a ajuda da musa o romance se safou e a Calíope entrou em depressão. Não querias saber o que é uma musa deprimida. Não é nada bonito de se ver!
Dionísio conduziu João por entre as oliveiras do Monte Parnaso. Apesar da distância percorrida não ser muita, o tempo que levou ainda foi razoável. O deus pura e simplesmente não conseguia andar direito de tão embriagado que estava. João teve mesmo que prestar auxílio algumas vezes para evitar a queda da divindade. Por fim, pararam junto a uma clareira.
– É sempre a mesma coisa! Tu trazes para aqui esses desgraçados e eu que os ature! – protestava uma voz feminina aos berros.
– O que é isto? – questionou João.
– Isto é a tua musa. Tens sorte, parece que hoje está de bom humor!


1 comentários:

Vitor Frazão disse...

Conto com direito a farpazinha já me agrada. ;)

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