As Crónicas de Decessus – O Demónio de Wharrom Percy 1/5 - Pedro Pereira
As chuvas de
Dezembro caíam com grande intensidade na escuridão da noite. Chovia
torrencialmente há horas, deixando as estradas e os caminhos completamente
alagados, transformando-os em autênticos rios de lama.
Montado no
dorso do seu garanhão negro, William tentava proteger-se da chuva com o seu
manto preto, o que lhe conferia um ar sinistro na escuridão da noite. Há muito
que perdera a conta às horas que cavalgava. Um camponês dera-lhe indicações
sobre a existência de uma vila na proximidades, mas era quase impossível
enxergar o que quer que fosse naquelas condições.
Ao lado do
cavalo, Moonraider, o encorpado lobo cinzento, fiel companheiro de William,
estancou. O animal começou a farejar e apontou o focinho para o horizonte.
O rosnar de
Moonraider foi o sinal que William procurava. Olhando para o horizonte,
conseguiu vislumbrar as ténues luzes que provinham de Wharrom Percy.
– Vem –
ordenou William para o lobo, com a sua voz grave e rouca. De seguida, conduziu
o garanhão em direção à vila.
As ruas de Wharrom
Percy encontravam-se completamente desertas. Nada que não fosse de esperar,
tendo em conta o temporal que se fazia sentir e a avançada hora da noite.
Quando
finalmente encontrou a pequena estalagem, William desceu do dorso do seu cavalo
e prendeu-o junto à entrada.
– Fica.
Obedecendo às
ordens de William, Moonraiser soltou um latido de desagrado e sentou-se ao lado
do cavalo, com ar pouco satisfeito.
O ambiente no
interior da estalagem aparentava estar calmo. Dada a hora da noite, havia apenas
meia dúzia de camponeses sentados nas mesas mais próximas da lareira da sala
comum. A maioria nem deu pela sua entrada. Estavam demasiado entretidos a
esvaziar as suas canecas de hidromel.
William
encaminhou-se para o balcão onde se encontrava o estalajadeiro, um homem gordo
e com ar mesquinho. Pelo caminho, puxou para trás o capuz do manto, revelando
os seus cabelos brancos e olhos amarelos, sinais que denunciavam a sua
condição…
– Arranje-me
um quarto e traga-me uma caneca de hidromel – declarou William, ao mesmo tempo
que deixava cair algumas moedas de prata no balcão.
– É para já,
Senhor. Vou preparar o nosso melhor quarto.
William foi então
sentar-se numa das mesas livres. Não tardou para que lhe levassem uma caneca cheia,
com a bebida dos deuses.
O forasteiro
saboreava calmamente a sua bebida, quando um homem moreno e franzino,
envergando um manto azul, se sentou a seu lado.
– O que o trás por estas bandas, meu Senhor? –
questionou o homem, num tom de voz pomposo e extremamente irritante. – Não é
habitual termos visitantes.
William
manteve-se em silêncio, na esperança de que o homem fosse embora. Estava
habituado àquela escumalha, sempre há procura de alguém que se oferecesse para
pagar umas bebidas, em troco de uns dedos de conversa. Porém, este parecia não querer
partir sem a sua resposta.
– Estou apenas
de passagem…
– Pensei que
tivesse sido atraído pelas mortes. Um caçador de demónios como você…
Aquelas
palavras deixaram William em alerta. Se o homem conhecia a sua identidade, isso
podia significar que havia gente suficientemente estúpida naquela terriola para
o tentar enfrentar. Era a principal desvantagem de ter a “cabeça a prémio”.
Porém, William decidiu participar no jogo, antes de começar a pintar o chão de
vermelho com a sua espada.
– Eu não sou
nenhum caçador de demónios. Além disso, duvido que a Peste Negra possa ser um…
William tomou
mais um trago do seu hidromel, com uma atitude de desdém.
– Alguém com a
“cabeça a prémio” devia ter mais cuidado com a sua identidade, Decessus…
O homem nem
teve tempo para mover um único músculo. Numa fracção de segundo, William
retirou uma pequena adaga da manga do manto e, por baixo da mesa, encostou-a à
virilha do homem.
O sujeito empalideceu
de imediato, ao sentir a lâmina afiada.
– A menos que
não tenhas amor à tua pila, sugiro que escolhas a tuas palavras muito
cuidadosamente…
– Eu sabia que
eras tu! Vi o teu retrato no cartaz! És tão sádico como contam!
– E o tempo
está a passar, e eu estou a ficar aborrecido… – declarou William, em tom de
ameaça, aumentando a pressão da lâmina.
– Temos um
demónio aqui na nossa vila… Ele tem atacado as nossas mulheres e crianças. Só
na semana passada morreram quatro pessoas – explicou o homem, apressadamente.
William podia
ver as gotas de suor a escorrerem pela face do homem. Não passava de um
campónio que gostava de se armar em valente. Se se mantivesse aquele impasse
por muito mais tempo, o desgraçado ainda se mijava nas calças.
– Por favor, precisamos da ajuda de alguém
como você!
– As boas ações
não enchem o estômago, nem ferram cavalos…
– Nós temos
dinheiro! Nós podemos pagar! Juro! Por favor!
– Nesse caso, começa a falar…
Continua…
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
2 comentários:
Uma boa escolha de imagem. :) Ainda é um pouco cedo para dar um parecer sobre a história do caçador de demónios, mas o ritmo está bom e este género de personagem costuma ter sucesso.
Gostei muito deste início, fico curioso com o que vai acontecer.
Enviar um comentário