Abraça-me para Sempre 3/3 - Carla Ribeiro


O inimigo fez-se anunciar com estrondos e luzes, à medida que as explosões e os disparos se reflectiam, cada vez mais próximos, nos corredores do refúgio onde os vencidos esperavam. E, no vazio da sua resignação, Aleks e Kari, perdidos nos braços um do outro, derradeiro conforto a que podiam aspirar, quase podiam tocar o manto da derradeira dama, a morte que caminhava nas brumas dos seus silêncios.

Como num pesadelo sem escapatória, ouviram o ritmo apressado nos passos dos soldados invasores, seguido do som de sucessivos disparos e, depois, dos gritos e gemidos dos que se viam atingidos, das súplicas vãs dos que tentavam ainda sobreviver. A misericórdia fora recusada. Não voltaria a ser oferecida, mas, ainda assim, havia entre eles os que, em pleno massacre, tentavam apelar à clemência. Com os clarões que iluminavam o refúgio, Aleks via, entre a figuração de um caos feito de sangue e cadáveres, a máscara do pavor que tomara posse do rosto da irmã e, por momentos, quase abençoou a sua cegueira por a poupar à tenebrosa visão que os seus olhos alcançavam, que em breve os atingiria. Mas os outros sentidos permitiam a Kari uma bem clara imagem do que ali se passava. Tal como o irmão, também ela sentia o húmido toque dos salpicos de sangue quando os que mais perto dela se encontravam eram destroçados pelas balas. Também ela sentia, denso e repugnante, o cheiro da carne queimada a propagar-se pelo espaço. E, como Aleks, também ela sentia nos lábios o sabor das dolorosas lágrimas que o desespero fizera nascer nos seus olhos.

E depois veio a dor, como uma carícia cruel desabrochando subitamente em mais pontos do seu corpo que os que poderia contar. A vaga certeza de um gemido entrecortado na voz de Aleks, fundido ao som que os seus próprios lábios haviam deixado fugir. E ainda o tremor dos corpos, únicos um contra o outro na iminência da morte. Um novo trovejar e novas flores de sangue abertas na carne dos moribundos. Um adeus sem palavras. E, por fim, no eterno vácuo de uma morte inglória, a escuridão do derradeiro desfalecimento. De dois cadáveres unidos por um abraço final. Na vida e na morte. Para sempre.





1 comentários:

Vitor Frazão disse...

Boa imagem final, mas lirismo em redor de um história relativamente simples desiludirá alguns leitores. Uma forma simplificada poderia ter transmitido a mesma ideia e não gasto tanto tempo.

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