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Bicho Cidrão
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Vitor Frazão
Bicho Cidrão – Diabo que não conheço 1/5 - Vitor Frazão
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Pode lá ser!
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Estou-te a dizer – garantiu Joaquim Silva, reposicionando a caçadeira no ombro
ao subir a encosta, apontando a boca para o chão. – Pensa bem, o que sabemos
sobre o bicho? A lenda fala de um pastor que, angustiado ao perder um cão fiel
e estimado, mandou para o ar meia-dúzia de palavras irreflectidas e acabou por
selar um pacto com o Tinhoso, sem dar por isso. Pouco depois tem o azar de cair
por um desfiladeiro, como o canito, e desde então, volta e meia, ouvem-se os
seus berros desesperados no montado. Típicos exageros e mal-entendidos à parte,
parece-me a maneira do povo explicar o caso de um homem fundido com um animal. Diz-me
lá, isso não te soa a um wendigo?
A
inteligência viva e desejo de se afirmar faziam Pedro Figueiredo esquecer o
constrangimento de contrariar o Obliterador mais velho, enquanto o seguia entre
os arbustos, com passos vigorosos, embora desajeitados.
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Será o wendigo mais pacífico do mundo!
Um lobisomem faz muito mais sentido, talvez um pobre desgraçado que tenha sido
infectado por acidente.
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Pedro, vamos esquecer o facto de o bicho berrar, não uivar, e a falta de
mortes, a lenda é demasiado antiga para o tempo de vida de um único lobisomem e
não temos relato de qualquer clã na Madeira – indicou, parando e sorrindo por baixo
do bigode. Ainda bem que o miúdo tinha pêlo na venta e não se ficava. Já não
estava com paciência para aturar outro palonço como colega, até porque esses
não costumam durar muito tempo… – Numa
coisa concordo contigo, é demasiado calmo para um wendigo. Numa ilha deste tamanho já era para ele ter umas quantas
mortes às costas. Seja como for, sempre é uma hipótese mais credível que um
lobisomem.
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Nunca se ouviu falar de um wendigo em
Portugal. Não faz mais sentido…
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O quer que ele seja, não será surdo – sussurrou autoritariamente a líder do
trio, agachada alguns metros à frente. – Mantenham as bocas fechadas e os olhos
abertos. Não interessa o que o bicho Cidrão seja, apenas que lhe limpemos o
sebo.
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Seria interessante saber com o que contar – cuspiu Silva, conhecendo a sargento
há demasiado tempo para se deixar intimidar pela fúria intensa que ela escondia
atrás do timbre calmo, frio e contundente.
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Não importa. Wendigo, lobisomem ou
qualquer outra aberração, com chumbo suficiente todos acabam por cair –
garantiu, voltando a prender os curtos cabelos castanhos e enfiando-os debaixo
do gorro negro. – Atacamos e não paramos de atacar até ele deixar de
estrebuchar. No final, levamos o que sobrar connosco e os ratos de laboratório
que se entretenham a descobrir a resposta.
“Como
sempre, elegante como uma marreta, Marisa” pensou o guerreiro mais velho, suspirando
perante a lógica simplista da líder.
Vendo
bem, a Dona Mau Feitio tinha razão. Não importava o que o bicho Cidrão fosse,
desde que o eliminassem e vinham bem precavidos para isso, de tal maneira que o
experiente Obliterador duvidava que conseguissem passar por meros caçadores,
caso as mochilas fossem revistadas.
Qualquer
que fosse a verdade por detrás da sua história triste, o bicho Cidrão era um
Oculto, um ser sobrenatural, um monstro cuja mera presença corrompia o mundo.
Cabia a guerreiros como eles proteger o Homem de aberrações como aquelas.
A
noção que este Oculto em particular escapara impunemente durante todas aquelas
décadas, porque as evidências não tinham sido convincentes o suficiente para a
chefia levar a lenda a sério, insuflava ainda mais a habitual paixão que a
Marisa Costa nutria pela causa. No ver de Silva, ele tinha ainda mais motivos do
que ela para levar aquele trabalho a peito, pois a última equipa enviada para
verificar a lenda, há quase quarenta anos, fora chefiada pelo seu pai. Os
predecessores voltaram de mão a abanar, convencidos, após várias noites no
local, que a lenda não passava disso mesmo. Apesar de dedicarem a vida a caçar
criatura que a maioria apenas acredita existirem em pesadelos, os Obliteradores
sabem também que nem todos os monstros que povoam as histórias do povo são reais,
por isso, o pai de Silva ter voltado de mãos a abanar em nada prejudicara a sua
reputação. A situação mudou há uma semana, quando um Colector encontrou
vestígios que provavam, não só, que a criatura existia, como também, que não
era uma alma penada, como algumas versões da lenda indicavam, mas antes um
Oculto de carne e osso, de espécie indefinida.
Era
impossível Silva não pensar naquela missão como uma oportunidade para redimir a
honra manchada do falecido pai, não sendo por isso que obcecava com ela, como a
sargento Costa. Não passava de um trabalho como qualquer outro e, como sempre,
não falharia.
Parte 5: http://fantasy-and-co.blogspot.pt/2012/09/bicho-cidrao-natureza-do-bicho-55-vitor.html
Parte 4: http://fantasy-and-co.blogspot.pt/2012/09/bicho-cidrao-valor-de-uma-vida-45-vitor.html
Parte 3: http://fantasy-and-co.blogspot.pt/2012/09/bicho-cidrao-elusivo-parte-35-vitor.html
Parte 2: http://fantasy-and-co.blogspot.pt/2012/09/bicho-cidrao-no-montado-25-vitor-frazao.html
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3 comentários:
Um começo intrigante...
Também gostei deste inicio, fico a acompanhar :)
Um bom começo, fico à espera de mais :)
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